segunda-feira, 14 de fevereiro de 2011
adriana godoy
imagem: Josefe aka Hipnosapo/ flickr
hoje, a poeta de segunda é Adriana Godoy - www.driaguida.blogspot.com
mineira, de belo horizonte, adriana escreve e enquanto canta as dores e espanta os espantalhos, debruça-se sobre o cotidiano- e vê as nossas incoerências e inconsistências- desnuda os nossos medos e joga luz sobre as nossas buscas- nosso caminhar no mundo em meio a um caos desfigurado- nós a cada dia nos desconfiguramos como se fôssemos máquinas avariadas-
e nem sabemos mais para que lado atirar nossos torpedos.
nesses tempos de fraquezas, covardias, de metafísicas baratas, crenças inúteis, fadinhas fodas, gnomos industrializados e elementais que tais, adriana nos convida a crer no homem, no ser humano que gravita
entre a órbita de si próprio
e nas constelações alheias...
e vê discos voadores planando nos céus das bocas
e vê bocas que se grudam, buscando os céus
e sente o inferno pulsando, ao alcance dos dedos
e dos medos...
mineira, sabe das profundezas abissais dos nossos vales interiores
e das elevações místicas das montanhas das gerais...
mas é muito mais, esta poeta de hoje:
é a voz que canta os homens
e suas moradas diversas.
canto meio desesperado
me ensine a percorrer esses
caminhos sem sombras
me diz embora o dia nublado
e os homens cinzas
que a noite vem com estrelas
tenho as mãos secas de agonia
imploro para que preserve os meus olhos
esses ossos e o coração já vacilante
que a morte é certa mas não precisa ser agora
descobri que tenho me escondido em vão
e o meu grito se estende como uma estrada longa e sem volta
vejo em você o que não queria ver em mim
e me assusto sempre
então me mostre o que não sei
e deixe a marca de seu amor
me contamine
nesse dia
que essa febre não vai me matar
pelo menos hoje não
desde que você me disse que não acreditava em discos voadores
desde que você me disse que não acreditava em discos voadores
mesmo quando te contei que vi um enorme pairando sobre a minha varanda
fiquei pensando no que você acreditava
além desse medo católico e evangélico
de ser condenado ao inferno
não precisa disso, cara
você já está condenado ao inferno de viver
nesse cartesianismo barato regado a um deus que julga e condena
está condenado a acordar cedo todas as manhãs e trabalhar feito mártir
e esperar desesperadamente o final de semana para encher a cara
e poder falar as merdas que você fala e se achar o senhor da verdade
de entrar em seu carro de luxo e me convidar para desfrutar de sua companhia
talvez em um motel
e com seu perfume francês arrotar canalhices
não, cara
não quero mais ficar a seu lado
mesmo que suas mãos saibam os caminhos que me levam ao paraíso
quero ficar aqui com meus discos voadores e poesia
tomar vinho com amigos e escutar música de verdade
e não ficar ouvindo esses sertanejos de merda
que ficam nos cedês espalhados em seu carro
não vou te aceitar mais, cara
mesmo que sinta falta de seu beijo
na minha vida não cabe mais você
vejo-o fazendo café
trago a vida entalhada em contas papéis livros
lembro quando via sessão da tarde e a tarde não passava nunca
hoje as tardes passam e não vejo
a noite vem como o dia
a noite é a mesma
mesmo quando você vem e diz que me ama
então olho o homem que atravessa a rua
e está com flores na mão
o livro que li há dez anos
vai ser o mesmo se o ler hoje?
vejo-o fazendo café
e a minha angústia costurada em seu pijama
e a vontade desesperada de fugir
dessas noites em que estava lavando pratos
o detergente faz espuma na pia
os pratos ficando limpos no escorredor
os pensamentos sujos quero um cigarro
uma música um blues o céu escuro
meus gatos escondidos em silêncio
duas taças de vinho quase cheias
os pés no chão e pálidos
uma janela uma luz acesa do outro lado
as garrafas de vinho abertas e vazias
leio os rótulos e penso num poema
um inseto esquisito vindo de outro lugar
voa em torno das garrafas vai até a luz e volta
o tempo não tem pressa meus olhos o seguem
os pratos vão ficando limpos
as panelas ficam pra depois
pego uma taça e dou um gole
acompanho o blues num inglês ruim
o inseto se vai e bebo mais
olho a noite escura os pratos brancos
alguém me espera no sofá
estranho pensar no abandono de toda ambição
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Pô, Danilo! Muito especial, fico sem palavras...Não sou tudo isso que vc disse, mas gostei muito e agradeço. Valeu, grande poeta. Beijão.
ResponderExcluirMerecida homenagem.
ResponderExcluirbeijos
Olá Danilo, aprecio muito a escrita despojada, singular e marcante da Adriana e a sua homenagem faz jus ao talento e sensibilidade dela. Um abraço.
ResponderExcluirÚrsula Avner
PARABÉNS, DANILO!
ResponderExcluirUma das nossas melhores poetizas. Verdadeira, franca, gente como a gente, real mesmo. O que tem que falar fala sem enfeitar com borboletas.
Sou fã nº1 dessa menina linda que amo como irmã!
Beijos aos dois!
Mirze
ótima a seleção... e grande a poeta!
ResponderExcluirParabéns, Danilo. A Adriana está de dorpo inteiro aí. E de alma. Com sua força contagiante.
ResponderExcluirUm grande abraço.
Danilo,
ResponderExcluirlinda homenagem. A Adriana é a poeta completa, arrojada, intrigante, contagiante e cortante. Diz tudo que nós, pobres seres humanos, não temos nem a ousadia de pensar e, ela, faz poesia.
Um abraço.
linda poeta Drika!
ResponderExcluirparabéns :)