segunda-feira, 28 de fevereiro de 2011

nydia bonetti


imagem: Deep Blue/Photomarathon Berlin

nesta segunda, apresentamos aos leitores uma poeta paulista- de Campinas - Nydia Bonetti- blog Longitudes- www.nydiabonetti.blogspot.com

Nydia: poeta das delicadezas, das leves tessituras, das filigranas, das nuances...
Nydia: poeta das tramas e urdumes de um vasto tecido azul- seda diáfana, sede de poesia, alvuras de garças, puro estado de graça: ler nydia é como levitar entre o azul e o azul: do azul mais profundo ao azul mais transparente, essa poeta nos leva aos píncaros, nos eleva ao sétimo círculo dos céus, nos enleva com seus doces brocados e bordados, lava nossas almas com seus poemas puros e serenos: haicais de pleno encantamento.

nydia desnuda nossas almas, corações e sentimentos: e fala da fluidez da vida, e da perenidade dos sentires. seus cantares, mesmo quando falam da fugacidade, da precariedade das coisas e da temporalidade das gentes ainda assim transmitem uma paz, um zen-timento de calma, de alegria, de entendimento dos seres.

são os rios que correm, plácidos e eternos, são as folhas que caem, secam, viram humus e renascem,com todo o vigor, é a ânima da vida se perpetuando, se refazendo, são as pedras que falam a linguagem mineral, os passarinhos que circundam seu espaço e cantam as cantigas de todos os dias- é a vida, enfim, que nydia nos dá de presente nesta poesia de pureza, leveza, e de aguda percepção das finitudes.

tudo é efêmero - tudo é passageiro - mas enquanto vivemos, vivamos a plenitude- ela quer nos dizer com seus versos encantados- curtos, plenos, vivos.

Nydia é a poeta de hoje: mergulhemos com ela, sem escafandro, nesse rios azuis infinitos, de nuances diversas, lancemo-nos coma ela nesses céus de anil- e como criança vamos rabiscar o azul do azul do céu - lapidando lá nossos versos e nossos sentires.



*

faz-se em mim desejo de silêncio
forte pleno denso
mão
que me aperta a garganta
e os pássaros
aprisonados
tantos
em vão
se rebelam [ por ora
o vôo
não se dará
e o canto


paisagem

ervas daninhas
mourões
apodrecidos
onde pássaros pretos
pousam
completando o retrato
do abandono


estrada ( rio...

1

passou
na paisagem feito um risco
de espátula
borrou
e o que seria estrada
tornou-se rio
lugar
onde não posso ir
sem que me molhem os pés

2.

suave
caminhar entre as águas
deixar-se ir
[...fluir

3.

agora eu sei
que todo rio vai virar mar
(se tiver sorte
e não morrer sufocado)
e se secar
será
finalmente estrada
[...que me leve


humanidadesmais uma vez

minha alma oscila: - entre céu e inferno
doçuras e amargores

- descrenças e esperanças, delícias e dores

mais uma vez

agradeço a meu Deus por sua humanidade
- e pela minha

Milagre

nasceu
de goiaba um pé

entre o tijolo do muro
e o concreto
do chão do meu quintal

cresceu

nele meu cão se abriga
do calor do verão

único verde
a humanizar do cinza
a aridez — milagre

de passarinho


Mal ou Bem-Dito

busco palavras - onde as encontro? todas tão gastas, puídas, todas
tão - sinônimas

manifesto verbal ou escrito. fonemas sem nexo, vocábulos. busco
articulado som. onde?

o silêncio se impõe. o silêncio é estado de quem se cala. a ausência
é estado de não presença

o estado é modo de estar ou ser. unidade dividida. falada língua. mãe
nação. onde?

soberania - extensão considerável. lagos, rios, solos – o chão. baias
geografias

geo - metrias, centrias, fasias – engulo terra. vomito palavras. tantas
jogo sujo. onde?

salvos pelo verbo, campo minado – território sitiado: minha pátria
língua. derrotado silêncio

quando não se tem o que calar, melhor falar. fica assim então o dito
pelo não. ou quase - mal ou bem. dito

segunda-feira, 21 de fevereiro de 2011

mercedes lorenzo


imagem: Skantzman/Flickr


a poeta de segunda, hoje, é mercedes lorenzo-
www.cosmunicando.blogspot.com


e de sanpaulicéia revirada chega o canto da palavra
e o encanto das imagens
desta poeta maior.
mercedes- de sedes tantas: sede da palavra que, lúbrica, se derrama
como leite bom,
trazendo à tona memórias, sentimentos
e as tantas signifâncias que delas podemos tirar.
mercedes traz luz às palavras-
rabiscadas sobre a pele do papel,
sobre a tela cibernbética-
sobre a tela dos artesãos da cor:
como elementos vivos, como cheiros:
e a nós cabe decifrá-las-
e recriá-las, a cada toque,
a cada torque dos dedos sobre o teclado
a cada risco de tinta
que escorre
lirismos entre os dedos

mercedes traz à vida imagens naturais e maturadas:
: fotogramas, fotodramas, lúcidos ensaios,
que falam por si sós:
poesia muda de se comer com os olhos,
de se beber com os ouvidos bem abertos,
de se embebedar
ouvindo o canto de sereia dos fotopoemas
e dos poemas fartos de tanta beleza...

mercedes: poeta concrelirica-
concreta nas raízes, nas metáforas, nas imagens
lirica na palavra que se derrama, sem cerimônia,
pelos seus versos que cantam, que gemem e que choram:
às vezes concisa, precisa, esteta-
outras vezes lírica em suas dúvidas e delicias:
imprecisa ao traçar sentidos e sentimentos-
lírica: como a vida quer

mercedes e suas sedes de tanto dizer- e do tanto, trago um pouco:


Há (H)

há sempre um meio
fluido
em meio a tudo
de compartilhar o nada
e ser de novo
mundo

E então ela encheu a noite

... de hoje
intersecção de nós
entre tanto
pensamento satélite
carruagem no céu
de luz difusa
abusada-mente linda
e vã.

Das Jardinagens

De todas as minhas acontecências
tem aquelas que repousam (jas)mim
e ficam sementemente cálidas
esperando chuva
Outras de gênio mais alecrim
brotam deserto, furam geada
ignoram inverno e reticências
sem se importar com mais nada

...são essas que me alfazemam


"Era Briluz"

porque me cabe a noite
nela me demoro.
vênus pisca numa torre imaginária
em cima do morro
vestígios do sol em segunda mão...
eis a senha
que sabe a silêncio.


Morph eu

dorme
meu
homem
teu sono leve
teu sonho justo
gasto
nos trilhos
dor
mentes
repousa o susto
dissolve a
dor
me
u homem
no afago lento
de
senhos
na epiderme
no epicentro
que eu
sismo
que eu
tremo
e
traço
geograficamente
em teu cansaço
que é
meu
amém
my
man.

poema branco

em linha reta
o risco é calculado
a língua se curva
na sede da palavra
a pena engana a folha
branca em essência
de tudo que turva
conturbando a via
o verbo, a vida
véu de inexistência
come a poesia

segunda-feira, 14 de fevereiro de 2011

adriana godoy


imagem: Josefe aka Hipnosapo/ flickr

hoje, a poeta de segunda é Adriana Godoy - www.driaguida.blogspot.com

mineira, de belo horizonte, adriana escreve e enquanto canta as dores e espanta os espantalhos, debruça-se sobre o cotidiano- e vê as nossas incoerências e inconsistências- desnuda os nossos medos e joga luz sobre as nossas buscas- nosso caminhar no mundo em meio a um caos desfigurado- nós a cada dia nos desconfiguramos como se fôssemos máquinas avariadas-
e nem sabemos mais para que lado atirar nossos torpedos.
nesses tempos de fraquezas, covardias, de metafísicas baratas, crenças inúteis, fadinhas fodas, gnomos industrializados e elementais que tais, adriana nos convida a crer no homem, no ser humano que gravita
entre a órbita de si próprio
e nas constelações alheias...
e vê discos voadores planando nos céus das bocas
e vê bocas que se grudam, buscando os céus
e sente o inferno pulsando, ao alcance dos dedos
e dos medos...
mineira, sabe das profundezas abissais dos nossos vales interiores
e das elevações místicas das montanhas das gerais...
mas é muito mais, esta poeta de hoje:
é a voz que canta os homens
e suas moradas diversas.


canto meio desesperado

me ensine a percorrer esses
caminhos sem sombras
me diz embora o dia nublado
e os homens cinzas
que a noite vem com estrelas

tenho as mãos secas de agonia
imploro para que preserve os meus olhos
esses ossos e o coração já vacilante
que a morte é certa mas não precisa ser agora

descobri que tenho me escondido em vão
e o meu grito se estende como uma estrada longa e sem volta

vejo em você o que não queria ver em mim
e me assusto sempre
então me mostre o que não sei
e deixe a marca de seu amor

me contamine
nesse dia
que essa febre não vai me matar
pelo menos hoje não


desde que você me disse que não acreditava em discos voadores

desde que você me disse que não acreditava em discos voadores
mesmo quando te contei que vi um enorme pairando sobre a minha varanda
fiquei pensando no que você acreditava
além desse medo católico e evangélico
de ser condenado ao inferno
não precisa disso, cara
você já está condenado ao inferno de viver
nesse cartesianismo barato regado a um deus que julga e condena
está condenado a acordar cedo todas as manhãs e trabalhar feito mártir
e esperar desesperadamente o final de semana para encher a cara
e poder falar as merdas que você fala e se achar o senhor da verdade
de entrar em seu carro de luxo e me convidar para desfrutar de sua companhia
talvez em um motel
e com seu perfume francês arrotar canalhices
não, cara
não quero mais ficar a seu lado
mesmo que suas mãos saibam os caminhos que me levam ao paraíso
quero ficar aqui com meus discos voadores e poesia
tomar vinho com amigos e escutar música de verdade
e não ficar ouvindo esses sertanejos de merda
que ficam nos cedês espalhados em seu carro
não vou te aceitar mais, cara
mesmo que sinta falta de seu beijo
na minha vida não cabe mais você

vejo-o fazendo café

trago a vida entalhada em contas papéis livros
lembro quando via sessão da tarde e a tarde não passava nunca
hoje as tardes passam e não vejo
a noite vem como o dia
a noite é a mesma
mesmo quando você vem e diz que me ama
então olho o homem que atravessa a rua
e está com flores na mão
o livro que li há dez anos
vai ser o mesmo se o ler hoje?
vejo-o fazendo café
e a minha angústia costurada em seu pijama
e a vontade desesperada de fugir

dessas noites em que estava lavando pratos

o detergente faz espuma na pia
os pratos ficando limpos no escorredor
os pensamentos sujos quero um cigarro
uma música um blues o céu escuro
meus gatos escondidos em silêncio

duas taças de vinho quase cheias
os pés no chão e pálidos
uma janela uma luz acesa do outro lado

as garrafas de vinho abertas e vazias
leio os rótulos e penso num poema
um inseto esquisito vindo de outro lugar
voa em torno das garrafas vai até a luz e volta
o tempo não tem pressa meus olhos o seguem

os pratos vão ficando limpos
as panelas ficam pra depois

pego uma taça e dou um gole
acompanho o blues num inglês ruim

o inseto se vai e bebo mais
olho a noite escura os pratos brancos
alguém me espera no sofá

estranho pensar no abandono de toda ambição

segunda-feira, 7 de fevereiro de 2011

nina rizzi

nina rizzi- me-nina so-rizzi - poeta das boas
que nos traz a brisa e o frescor dos ventos
de fortabeleza bela-
nina- poeta maior- das coisas pequenas- dos sentimentos guardados- dos gritos arrrancados dos peitos-
poeta dos amores grandes e miúdos do cotidiano- dos fazeres e desfazeres afazeres de todos nós- que brigamos, brilhamos e nos afogamos entre nossos lúdicos jogos de faz-de-conta: almejando céus e nos arrastando aos infernos-
nina- poeta pop- dessas coisas que nos movem dessas coisas que nos alimentam- poeta de cactos e de cravos, de espinhos e de rosas - poeta de neologismos e de palavrinhas e de palavrões- nada aqui escapa de sua argúcia e de sua astúcia - as pendengas e as mandingas e o amor. ah! esse decantado e cantado em prosa e verso.
publico hoje alguns( entre tantos demais) poemas dela: aragens de ar fresco, jatos de água refrescante
na poesia e na língua:
o sorriso de nina- solto- como se fosse o sorriso do gato de alice-
ali se lê: ode à vida!


outra arte

nascer um pouco
a cada dia. perder-se, morrer
um pouco a cada dia


um


a música é alegre
geladeira, fogão, chuveiro frio
finalmente meus

valha! diabéisso?
esses cacos insistentes
no banheiro, na cozinha,
nas paredes?
: é em mim...
a alegria é dos gados
o lar,
vazio

rhythm and poetry ou bethoveeniana
nina rizzi


o sofá, a sacada, o colchão imundo jogado no chão
e tudo quase-tão escuro.
tese xvnina rizzi

enfio cada um dos dedos nos dez
mil anos de história, gracejo.

não guardo a perícia no trato com moscas e murisókas
carapanã-pinima, sou um espanto.

como quem prepara o melhor vinho calabrês
pisoteio, levanto a saia, giro espelhos, vos vomito.

que não sou eu, mas a indiferença,
o peso morto da história


goiabada-cascãonina rizzi


gosto do jeito dele de não me olhar quando cozinho,
de não se importar enquanto limpo os vômitos, as cinzas, seus restos.
até mesmo quando olha os seios ou as pernas das moças pela janela.


mas bom mesmo, gosto mesmo, das vezes que ele desaparece
e posso dormir, ser eu mesma, sozinha ou não, mulher<

Transitoriedade
há sete, dez anos talvez
na esquina daquele beco
havia lá um boteco
de quinta
saudosa lá voltei
contemplei as mesmas paredes descascadas
e bancos e mesas e copos
sujos surrados
a privada ainda quebrada
(o mesmo petisco e a cerveja gelada)
o mesmo cheiro no mesmíssimo dono
que é o mesmo
: gordo oleoso pastoso
quase medonho quase deus
entre o imundo imutável
tudo igual
: menos eu